Cobras, aranhas e lagartos: livro e retrato em close-up de uma unidade ambiental

JB, Caderno B, p.B4-B5 - 04/12/2003
Cobras, aranhas e lagartos

Livro é retrato em close-up de uma unidade ambiental

Anabela Paiva
A miopia foi a primeira professora de fotografia do jornalista Marcos Sá Corrêa. Com ela, ele aprendeu o encanto de colocar o mundo em foco através de uma lente. Ainda não se cansou do hobby. Pouco mais que um adolescente, usou a Nikon como passaporte para entrar na primeira redação, a do Jornal do Brasil, em 1966. Acabou trocando as lentes pelas máquinas de escrever. Mas não deixou o vício do clique. Tanto que, aos 56 anos, acaba de estrear como autor de livros de fotografia. Itatiaia - o caminho das pedras, que será lançado hoje, às 19h, pela editora Metalivros no Solar da Imperatriz (rua Pacheco Leão, 2040), revela um Cartier-Bresson das lagartas, besouros e sapos.
Mas a proposta do livro vai além de registrar, através da macrofotografia, a riqueza natural do Parque. As quase 200 imagens de flores, animais, insetos e paisagens são acompanhadas por uma reportagem que conta a história e o cotidiano da unidade.
- Tento mostrar como o Parque é um modelo exemplar da dificuldade que o Brasil tem de criar reservas ambientais - explica Sá Corrêa.
Criado em 1937, Itatiaia foi o primeiro parque nacional do Brasil. Com um atraso constrangedor em relação a outros países (depois do Congo e da Argélia), o país inaugurava uma política de preservação ambiental, plantando 12 mil hectares de reserva no Vale do Paraíba, uma região devastada no século 19. Hoje com 30 mil quilômetros quadrados e uma complicadíssima situação fundiária, o lugar é uma espécie de museu da paisagem brasileira, incrustrado na divisa do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo.
- As pessoas acham que o lugar, por ser alto e frio, é exótico. Não é. Exótico é tudo o que tem em volta. Se o Brasil tivesse sido conservado, seria aquilo. Como acabamos com a complexidade do Brasil antes de conhecermos, hoje, quando a gente vê o Brasil, não reconhece.
Sá Corrêa começou a ir lá com os pais (é filho do colunista do JB, Villas-Boas Corrêa), há mais de 40 anos. Nos últimos cinco, aproveitava qualquer chance para pegar a Via Dutra em direção ao Pico das Agulhas Negras. Lá, costumava passar dias inteiros caminhando pelo mato, carregando tripé, flashes e suas câmeras Canon e Hasselblad.
- O Parque do Itatiaia costuma entediar o turista que vai lá correndo, e a ocupar a vida inteira das pessoas que se dedicam estudá-lo.
Para os que se queixam da falta de brinquedos e quadras de esporte, Marcos recomenda abaixar-se diante de uma folha. Percebe-se então, escreve ele, que ''o parque não tem só os 30 quilômetros quadrados dos limites oficiais. Tem 30 bilhões de centímetros. E pode ter 30 trilhões de milímetros.'' É essa a perspectiva que tornou a unidade uma meca para biólogos - no momento, 50 teses estão sendo elaboradas ali.
Para estudar este microcosmo, há que aprender alguns truques, ensina Marcos.
- Borboletas tendem a ficar paradas de manhã cedo, por exemplo. Outra coisa que percebi é que todo inseto mimético, que imita a paisagem à volta, fica parado quando percebe algum perigo. Com eles, a tática é fazer com que saibam que você está por perto.
No livro outros retratados: os humanos que vivem em torno do parque, especialmente os seus funcionários.
- Ele incorporou as pessoas que dedicam a sua vida ao Itatiaia - diz o diretor da unidade, Léo Nascimento. Gente como Marcos Botelho, da guarda anti-incêndio, filho de funcionários do parque.
- O parque preserva também um tipo de funcionário público que está quase extinto. São verdadeiras dinastias de servidores que têm orgulho de estar ali - diz o jornalista.

JB, 4/12/2003, p. B4-B5
Produção Cultural:Literatura

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