Degradação sócio-espacial na Amazônia: a ameaça de empreendimentos em áreas indígenas e de conservação

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Degradação sócio-espacial na amazônia: a ameaça de empreendimentos em áreas indígenas e de conservação

Data: 27 de julho de 2023Autor: Internacional da Amazônia 0 Comentários
Keity Oliveira e Lara Lima (acadêmicas do 6o semestre de RI da UNAMA)

O modo de sobrevivência e organização social das comunidades tradicionais estão diretamente ligados com a conservação da biodiversidade amazônida, isso porque elas dependem dos recursos naturais para a sua sobrevivência, uma necessidade que vai muito além de apenas uma produção de subsistência. Nesse sentido, o espaço territorial se configura como um dos principais fatores para a sobrevivência dos povos, sendo marcado pelas tentativas de exploração predatória do sistema capitalista e seus projetos desenvolvimentistas.

Os grandes projetos de desenvolvimento para a região, além de afetarem o meio em que as pessoas vivem, afetam também o modo de vida, a cultura e as relações das comunidades com seu meio. A cosmologia entre os povos da floresta, depende da relação com o meio ambiente e quando essa relação é alterada de forma abrupta pela destruição de seus territórios, a saúde espiritual dos povos é afetada. Não há forma alguma de mitigar, diminuir ou suavizar os impactos trazidos por empreendimentos em áreas protegidas e de conservação, que corroboram para a destruição e o assassinato de um povo.

Historicamente, com o avanço do capitalismo e suas vertentes de exploração na Amazônia, as populações indígenas, quilombolas, lavradoras e outras, vivem em constante ameaça do rompimento com seu principal meio de vida, a terra. Desde os primeiros indícios de colonização até por volta de 1850, quando aconteceu a Lei de Terras, a destruição dos territórios das populações originárias já era observada (Elizângela, 2018).

Atualmente, muitos são os projetos de infraestrutura pensados para a Amazônia, tais como hidrovias, estradas, pontes, dentre outros já realizados, com o intuito de angariar o desenvolvimento no território, porém, acabam por estimular o desmatamento, o aumento das ameaças às áreas indígenas e de conservação, além de trazerem uma série de consequências para o meio ambiente.

Para Brandão (2011), o essencial para um projeto desenvolvimentista é que ele seja benéfico em várias extensões, sendo um benefício produtivo e social em diversas escalas espaciais, como global, nacional, regional e local. Porém, os projetos desenvolvimentistas na Amazônia divergem das ideias citadas pelo autor, visto que as decisões voltadas para esses projetos de infraestrutura não ocorrem em consenso com as populações originárias das regiões, ocorrendo um refreio no poder de decisão das populações locais.

Com esse intuito, os responsáveis por trás dos projetos recorrem à manipulação das leis, a violência física e à manipulação ou ocultação de informações, bem como outros meios ilícitos.

Um exemplo atual é a proteção de Territórios Indígenas (TIs), que sofrem com a ameaça de construção da rodovia Pucallpa-Cruzeiro do Sul, que pretende ligar o Brasil ao Peru. O projeto é promovido pelo Governo Federal e o Governo Regional do Peru, com o intuito de ligar comercialmente as cidades aos portos vizinhos, porém, essa rodovia dividirá o Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD, uma Unidade de Conservação (UC), situada no Acre (MELO, 2022) e que possui uma vasta extensão territorial para proteção e conservação, segundo pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).

É importante observar que as famílias que vivem na região do Parque Nacional da Serra do Divisor se utilizam do mesmo para seu sustento próprio, fazendo com que o futuro projeto possa trazer degradação da fauna e flora e até mesmo impactos no regime climático da região, entre outros riscos ambientais, ao atravessar o território. O projeto também corta cerca de dez comunidades indígenas na região da Amazônia peruana, além de ser o abrigo de diversos animais ameaçados de extinção.

Nesse sentido, é válido ressaltar a falta de respeito aos elementos sociais e culturais de um povo que perde o poder de decisão sobre sua própria vida. O bem-estar dos povos tradicionais e das terras indígenas e de conservação são regularmente negligenciados quando se diz respeito ao desenvolvimento, como afirma Loureiro (2009), no qual tais aspectos são considerados menos importantes se comparado aos indícios econômicos.

De acordo com os dados do Atlas de Conflitos Socioterritoriais Pan-Amazônico, entre os anos de 2017 à 2018, o Brasil se configurou como líder em conflitos socioambientais, com o registro de 1308 conflitos, sendo um dos países com maior área da região do Pan-Amazônia (MODINO, 2020). Os países que possuem alguma parte da floresta amazônica em seu território foram analisados e em sua grande maioria, ocorrem grandes conflitos relacionados diretamente a disputas de terras próximas ou nas comunidades amazônidas. Nos dois anos apresentados pelo Atlas, foram registradas 118 mortes, sendo 80 mortes somente no Brasil por conta de conflitos socioambientais, além de serem apresentados dados referentes a casos de agressão de diversas formas, no qual muitos perderam a vida, lutando por suas terras. (MODINO, 2020).

Outro exemplo a ser citado é o projeto da Ferrogrão (EF-170) que teve início em 2018, um trajeto de quase mil quilômetros de ferrovia que atravessará o centro do país em meio às áreas de proteção, tendo como objetivo reduzir o custo do transporte para os grandes produtores agrícolas. Um levantamento do projeto feito pelo InfoAmazonia com colaboração do Joio e o Trigo, mostra que a ferrovia afetará uma população de mais ou menos 800 mil pessoas, cerca de 6 Terras Indígenas, 3 comunidades isoladas e 17 unidades de conservação, em 25 municípios do Mato Grosso e do Pará. Segundo os dados do levantamento, o projeto perpassa 7,3 mil km² de terras indígenas e ultrapassa 48 mil km² sobrepostos às unidades de conservação (Mídia Ninja, 2023).

Até o presente momento, o ministro Alexandre de Moraes paralisou os processos para fazer uma análise do projeto da Ferrogrão, de acordo com a lei 13.452/2017, que propôs provisoriamente a diminuição da área do Parque Nacional do Jamanxim para acomodar a ferrovia, proposto pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB). O projeto obteve uma discussão pública com o ministro em maio deste ano para a retomada dos processos administrativos e estudos da área, assim como foi solicitado ao Governo Federal, uma conciliação voltada para as questões ambientais (Mídia Ninja, 2023), conforme relata Garzon, coordenadora do Programa Xingu do Instituto Socioambiental (ISA).

A Secretaria de Gestão Ambiental e Territorial Indígena do Ministério dos Povos Indígenas relata o aumento da impertinência do agronegócio e o aumento nos números de pesca ilegal, extração de madeira nas terras amazônidas, dentro outros impactos que apontam para a dificuldade sofrida pelos povos originários de terem seus territórios reconhecidos e respeitados. Nessa perspectiva, o ISA destaca que "o que mais afeta as terras indígenas são os impactos gerados pela interação dos empreendimentos no território" (Mídia Ninja, 2023), o que condiciona maiores problemáticas socioambientais na região.

Em vista disso, o debate sobre degradação sócio-espacial na Amazônia traz como pauta, a importância da demarcação de terras indígenas para a sobrevivência da diversidade étnica-cultural das comunidades nativas. Apesar da Constituição Federal de 1988 ter feito um grande avanço no que diz respeito ao reconhecimento dos direitos dos povos tradicionais brasileiros, ainda há muito o que ser feito para proteger e resguardar a vida dessas populações e do território amazônico.

As tentativas de projetos desenvolvimentistas em áreas indígenas e de conservação, tornaram-se fatores de risco para o contínuo ataque às populações que lutam para terem sua visibilidade e seus direitos respeitados. Nesse sentido, o comunicador Tarisson Nawa, do povo Nawa, destaca que:

"Nós fomos forçados a sair do nosso território ancestral porque o houve a transformação dos territórios indígenas em grandes cidades no Acre, como a cidade Cruzeiro do Sul, que era o nosso território ancestral. Então, o que vai acontecer é um processo violento de matança física e cultural do nosso povo" (MELO, 2022)

Diante o tema exposto, recomendamos dois documentários sobre a temática. O primeiro se chama "Belo Monte, Anúncio de uma Guerra" (2022), dirigido por André D'Elia. O longa traz entrevistas e relatos sobre a Usina Hidrelétrica de Belo Monte desde o começo, quando ainda era um projeto da ditadura e resgata imagens do episódio que marcou a insatisfação e o início da resistência indígena contra a construção da usina. A realização de Belo Monte simbolizou um golpe no coração da região e se tornou o ponto chave para que mais projetos semelhantes sejam construídos na Amazônia. O documentário está disponível para ser assistido no Youtube, através do link a seguir:



O segundo se chama "Três Alves" (2021), dirigido por Vander Colombo. Conta a história de três irmãos indígenas da etnia Avá-Guarani que lideraram a retomada de terras perdidas pela construção de Usina Hidrelétrica de Itaipu Binacional. A história do trio, narrada no filme com uma alegoria da diáspora guarani, é fundamental para o entendimento do processo de migração dos povos indígenas na tríplice fronteira. O longa está disponível para ser assistido no Youtube, através do link a seguir:

< https://www.youtube.com/watch?v=WcMlgJu0elg&ab_channel=L%27avantFilmes >

Evidencia-se a importância do programa Povos Indígenas no Brasil, herança que o ISA - Instituto Socioambiental - recebeu do CEDI (Centro Ecumênico de Documentação e Informação). O programa possui um vasto acervo histórico-social sobre as comunidades indígenas do Brasil e traz informações sobre como funcionam as demarcações de terras na Amazônia. Para mais informações, acesse:

Link do programa: < https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Xingu >

Site do ISA: < https://www.socioambiental.org/ >

Instagram: < https://www.instagram.com/socioambiental/ >

Facebook: < https://www.facebook.com/institutosocioambiental >

Twitter: < https://twitter.com/socioambiental >

Por fim, destaca-se o Alertas+, um painel que rastreia alertas como desmatamentos, garimpos e queimadas em Terras Indígenas e Unidades de Conservação da Amazônia Legal. Os alertas são classificados e agrupados em diferentes critérios de acordo com sua consulta: especificando o tipo de alerta, a região e o recorte espacial. Para mais informações, acesse:

Site: < https://alertas.socioambiental.org/?lang=pt-br# >

REFERÊNCIAS

BRANDÃO, Carlos. Visões teóricas sobre desenvolvimento regional e a questão das escalas (mundial, nacional, subnacional e local) nas políticas regionais contemporâneas. Brasília, 21 de julho de 2023. 25p. Acesso em: 21 de julho de 2023.

CARDOSO, Elizângela de Araújo Silva. Povos indígenas e o direito à terra na realidade brasileira. 2018. Disponível em:
Amazônia:Políticas de Desenvolvimento Regional

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